Psicoterapia Antroposófica e Trabalho Biográfico

Vigo - Espanha
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      Muitos são os caminhos. Muitas são as possibilidades de atividades psicoterapêuticas. E para cada pessoa, umas certamente se adequam mais, outras nem tanto.

         Queremos falar aqui, de uma atuação psicoterapêutica que fala ao EU do paciente. Que trabalha com a consciência, indo de encontro ao inconsciente, trazendo imagens. Numa orientação do verdadeiro caminho a ser trilhado por este EU através de sua história de vida.

        Por isso mesmo, é nas histórias de vida das pessoas que vamos buscar. Observando e percebendo como inconscientemente o enredo dessa história foi se desenrolando, para conseguirmos captar o “fio vermelho” da biografia e qual seu sentido. Vendo e observando, como se encontra no momento atual, e como poderá então, encaminhar-se no futuro. Percebendo o que pode ser realizado ou modificado. Revelando que a biografia humana é muito mais que a história de uma vítima.

            O que foi, é um fato. Como está, tem a ver com o que está sendo feito. Como ficará, depende do que se fizer, daqui para frente. Parece simples. Mas a incerteza e a angústia do que fazer, como fazer, ou o que mudar, não é algo simples. O que gera muito sofrimento e dores emocionais, que por vezes chegam até o físico.

          Então, se buscarmos orientação e esclarecimento sobre o que está acontecendo conosco, poderemos reconhecer o que se passa em nossa alma. De forma que possamos ter novas impressões, dando outro significado ao nosso passado e presente. Com o que, certamente encontraremos forças e conseguiremos visualizar algo em nosso futuro. “Tal qual, quando se está navegando no escuro sem instrumentos e se avista um farol”. Sem minimizar os fatos, a crise, a dor ou a doença, sem também dar demasiado valor a estes, mas respeitando-os no que podem estar revelando e no que estão trazendo como oportunidade de aprendizado. “Eles podem vir a se tornar a bússola”.

          A Psicoterapia Antroposófica e o Aconselhamento Biográfico se ocupam do fortalecimento do EU, não no sentido do individualismo, mas de fortalecimento da vontade consciente, do agir no mundo com o outro.

         É um trabalho que pode ser realizado individualmente ou em grupo. Com trabalhos de pinturas com aquarela, argila, contos de fadas, mitologia, conversação, observação de obras de arte, dos ciclos da natureza. Serve como instrumento de autoconhecimento e de autodesenvolvimento para qualquer pessoa, em qualquer fase da vida. Não que seja simplesmente mágico e tudo resolva. Mas que ao ser adequadamente utilizado e bem conduzido, respeitando-se as características de cada indivíduo com suas dificuldades e seus sofrimentos, de acordo com a fase da vida em que este se encontra, permite cada qual se perceber melhor no seu momento de crise. É um trabalho que auxilia o indivíduo a reconhecer sua própria natureza e que as crises e as dificuldades fazem parte do desenvolvimento natural do amadurecimento psicológico do ser humano.

           A Antroposofia (conhecimento acerca do homem) - Ciência Espiritual, trazida pelo filósofo austríaco Rudolf Steiner (1861-1925) - ao nos dar a concepção trimembrada do ser humano, como ser biológico, psicológico e espiritual, aliada à Psicologia Analítica de Carl Gustav Jung (1875-1961) permite essa prática psicológica que busca libertar a individualidade do “fatalismo”, e todos os “ismos” que a aprisiona em seus sentimentos individuais. Ajudando a descobrir que é possível vencer as determinações do destino, e que a morte, o dinheiro, as prioridades, os valores, o amor, a moralidade, a solidão e a depressão são questões filosóficas profundas da humanidade, e não exclusivamente pessoais.

           É certo, porém, que o modo como cada um lida com todas estas questões, é pessoal. É pessoal e pode ser aprendido a ser feito diferente, indo de encontro a sua verdadeira essência, ao si-mesmo. E conseqüentemente ir se perdendo o vazio, a angústia, o desespero, a necessidade de recorrer ao uso abusivo de tranqüilizantes, antidepressivos, álcool e demais drogas, tão comuns em nossa época.

           Conhecer sua própria história. Trabalhar sua biografia. Tomar o destino em suas mãos. É o que nos propomos.

 

                                                      Psicóloga Antroposófica Marisa Clausen 

                                                                             CRP - 12/00295

                                                                   

TEMA: O caminho de autodesenvolvimento do psicoterapeuta: ´Conhece-te a ti mesmo´ e a trajetória de Parsifal.                     

                    

 

Constantemente ouvimos falar da importância de um trabalho interior a ser realizado por quem se propõe ser psicoterapeuta. Queremos falar aqui do trabalho interior a partir do caminho de autoconhecimento esotérico, do caminho de iniciação dos centros de mistérios da antiguidade que propunham: conhece-te a ti mesmo.

 

Quem sou eu? De que dor de alma eu padeço? O que fazer enquanto ser humano livre na atualidade?

 

Estas são questões existenciais que o estudo da espiritualidade e o cultivo da meditação, podem tão bem contemplar em nós. Dando-nos a oportunidade do autodesenvolvimento necessário para nossa atuação psicoterapêutica, ainda mais se tratando de intervenções psicológicas com o intuito de serem intervenções ampliadas antroposoficamente.

 

Podemos usar como referência o caminho trilhado por Parsifal em sua trajetória na busca do Castelo do Graal. No exercício de aprender, através dos conhecimentos acerca do ser humano trazidos pela Antroposofia, a trabalhar com perguntas.

 

 Pois que, só tendo trilhado a partir da espiritualidade o caminho do ´conhece-te a ti mesmo´ podemos conduzir seguramente outros pelas sendas do autoconhecimento e consequente autodesenvolvimento desejado, e assim conseguirmos constituir uma verdadeira Psicologia Antroposófica.

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Abordei sob este aspecto o tema proposto para esta mesa redonda, a Espiritualidade e a Psicologia Antroposófica do 1ºEPAPA (São Paulo 24 a 26/10/2014), por desejar salientar a importância de não cairmos no equívoco de transformar a Psicologia Antroposófica meramente em mais uma abordagem técnica baseada, por exemplo, em leis biográficas ou visão quadrimembrada do ser humano.

 

Mas sim, que tenhamos claro, que para desenvolvermos a Psicologia Antroposófica, precisamos trilhar caminhos da Espiritualidade, como caminhos de autodesenvolvimento e autoconhecimento. Reconhecendo-nos como este cidadão de dois mundos, reconhecendo o fato de sermos seres espirituais que se desenvolvem enquanto seres humanos numa existência terrena. E que enquanto Psicoterapeutas Antroposóficos, na compreensão dos transtornos da atualidade, na compreensão dos sofrimentos da alma humana na lida diária do aceleramento dos processos, globalização, invasão do mundo virtual nas relações, entre tantas outras coisas; consigamos desenvolver compaixão por esta alma que sofre por não conseguir não mais se ferir a si mesma, abandonando-se neste esvaziamento de seu mundo interno.

 

Faz-se mais do que necessário então, que além de acolhermos o sofrimento e a dor do outro, estejamos preparados e sejamos capazes de lhe proporcionar orientação para a retomada de um caminho de desenvolvimento espiritual, não importando a religiosidade que este professe, mas sim que este não se perca na materialidade e tampouco numa espiritualidade exacerbada, trazendo-o para um encontro de si mesmo como ser humano, num encontro de almas com outro ser humano.

 

E para tal, me parece que a trajetória de Parsifal, como um precursor do ser humano moderno, nos serve de conteúdo inspirativo e modelo. Onde possamos desenvolver a coragem e a humildade de nos perguntarmos quanto a quem somos verdadeiramente e qual caminho seguir, ao nos propormos auxiliar outros em suas caminhadas.

 

Ao acompanharmos Parsifal em sua jornada, nos fica evidente o quanto o acordar, desenvolvendo consciência, isto é, buscando conhecer com verdadeiro interesse o que é o mundo espiritual, nos confere a oportunidade de trilharmos um caminho de espiritualidade em liberdade. Um caminho espiritual que nos permita questionar e nos auxilie a caminharmos a partir de nossas perguntas e ações, tal como o caminho de Espiritualidade orientado pela Antroposofia.

 

Para tanto é salutar e necessário que estudemos a Antroposofia, enquanto Ciência Espiritual, como Cosmologia, não ficando somente com o que foi trazido correlacionado diretamente com a Psicologia. Mas sim, que entremos na senda do conhecimento esotérico, no verdadeiro caminho do: ´conhece-te a ti mesmo´.

 

Pois a humanidade cruzou o limiar! E com isto, daquilo que só no sono ou na morte fazíamos contato, nos acontece de nos depararmos a qualquer momento, mesmo em vigília, e isto nas assusta! Nos causa traumas e adoecimentos, pelo desconhecimento do que está se passando conosco e com as outras pessoas.

 

Temos vários cursos de formações complementares baseados na Antroposofia, além do curso de Psicologia Antropoosófica, tais como os de Biografia Humana, Terapia Artística, Cantoterapia, Euritmia, Pedagogia Social, Pedagogia Curativa, Goetheanismo e outros, que nos dão ótimas ferramentas de trabalho terapêuticas. Contudo, junto destas ferramentas que nos auxiliam tão bem em nossas atuações no mundo externo, é de fundamental importância, que nos habilitemos com ferramentas terapêuticas, fomentadas em nosso mundo interior, tais como as que nos são dadas no caminho dos seis Exercícios Complementares, o caminho dos Seis Passos, onde fortalecemos o coração etérico, desenvolvendo o ´ouvir ´ do coração. O que nos trará a capacidade de intuir em nossos pensamentos, o que o paciente necessita, e nos mantermos na integridade de nossa saúde física e mental.

 

Sergei O. Prokofieff  em seu livro O Encontro com o Mal, fala sobre esta época atual dos séculos XX e XXI e todos os acontecimentos a que estaremos expostos e com os quais estaremos tendo que lidar, independentemente de nossas profissões ou nacionalidades. E aponta sua superação na Ciencia Espiritual, como a pedra fundamental do Bem.

 

Para tanto, podemos então, fazer mais ainda! Podemos junto com o caminho dos seis passos dos Exercícios Complementares, irmos além: trabalhando-nos no caminho meditativo a partir do que nos é proporcionado como conhecimento, no caminho dado nas Aulas da 1ª Classe, da Escola Superior Livre de Ciências do Espírito (Goetheanum). No verdadeiro caminho do ´conhece-te a ti mesmo´, da Escola de Micael aqui na Terra.E assim termos o suporte interno necessário, para melhor trabalharmos junto com nossos pacientes e enfrentarmos as situações geradas pelas forças adversas. Para que não nos tornemos, como diz um colega meu médico psiquiatra, ´antropotécnicos`, mas sim verdadeiramente ´antroposóficos´, na humildade do ser humano em desenvolvimento.

 

Parsifal aqui também, nos serve de referência. Depois de ter conquistado no mundo externo o grau máximo de iniciação como Cavaleiro da Távola Redonda, ele parte em busca do Castelo do Graal, na busca de seu verdadeiro destino, na realização interna de servir ao mundo espiritual, tornando-se assim um Cavaleiro do Graal, no caminho do Cristo aqui na Terra, em conjunto com Micael.

 

Pois como, falou uma vez Bodo Von Plato (membro do Conselho Executivo da Sociedade Antroposófica do Goetheanum, Dornach / Suíça) numa palestra sobre Meditação: na lenda do Graal existe um primeiro momento onde Parsifal se encontra com o rei ferido, que é a imagem do ser humano em si que se feriu. Qual seu sofrimento? Parsifal não sabia e não perguntou.

É que com o conhecimento da humanidade até aquele ponto, não havia como perguntar sobre a ferida da relação entre a corporalidade e a espiritualidade. Apenas a alma é capaz de curar esse ferimento, e essa alma só pode atuar em conjunto com outra alma. O Graal não era capaz de curar essa ferida espiritualmente incurável, mas, através da pergunta da alma que se comove, a cura se torna possível. Torna-se possível mediante a compaixão e o encontro das almas, da conexão das almas através da pergunta.

O ser humano se encontra em um limiar existencial, mas no exato momento em que começa a se perguntar “quem sou eu enquanto ser humano?”, começa um novo destino. Até então, valeu um destino que o conduziu, mas a partir de agora o que valerá é até onde pode carregar o seu próprio destino.

O que será que o ser humano precisa quando começa a carregar seu próprio destino? O que ele precisa quando se faz a pergunta “Homem, reconheça a si mesmo?”. A partir do momento que não se é mais carregado pelo destino, e sim que o carrega, o homem percebe que não consegue fazer isso sozinho, toda a educação não o ajuda nisso, ele precisa de outros seres humanos que o queiram enxergar, que o reconheçam. E para que se torne uno o ato de ser reconhecido, para que um e outro se tornem um, é necessário uma nova unidade criativa. E isso se torna o centro de experiência Crística.      “Quando dois ou mais se reunirem em meu nome Eu estarei entre eles”.

 

Quando somos procurados como psicoterapeutas, trata-se exatamente destas questões existenciais quanto ao seu destino que o paciente nos pede socorro. E para tal é que devemos estar habilitados, tanto quanto tendo compreensão e conhecimento dos transtornos atuais a partir daí gerados, quanto a podermos auxiliar na retomada deste seu destino em suas próprias mãos, a partir do reconhecimento de si mesmo como ser espiritual que é, e de tudo o que está exposto nesta nossa época atual.

 

 

Daí, eu ter escolhido esta imagem (acima), desta escultura em Saint Baume, que tão bem retrata a dor humana. Uma imagem que me ajude a não mais ter a ilusão de achar que como psicoterapeuta eu possa ser como a Maria Celeste, em sua ´Pietá´, mas me reconhecer tal como Maria Madalena, em seu caminho terrestre humano como fiel servidora do Cristo, que trabalhando em si a aceitação dos acontecimentos (Semana Santa) prepara o caminho, para o que tinha de ser.

 

E acredito que, esta deva ser a prática da Psicologia Antroposófica junto da Espiritualidade. Ser um caminho de sacramentalização do encontro de almas. Que na humildade, enquanto ser humano que sofre, através do trabalho com perguntas, despertemos a vontade e o interesse do outro, e assim desenvolvamos em conjunto e em fraternidade, o autodesenvolvimento humano. Para que contribuamos, num trabalho Micaélico, auxiliando agora o ser humano se tornar capaz de carregar seu próprio destino, exercitando sua liberdade de escolha no fortalecimento de seu Eu.Tendo a Espiritualidade como caminho, na luta com o mal, fazendo o bem.

 

                           Psicóloga Antroposófica Marisa Clausen  CRP 12/00295

 

Referências Bibliográficas:

Lievegoed, Bernard – O Homem no Limiar – o desafio do autodesenvolvimento. São Paulo: Editora Antroposófica, 1999.

Bodo Von Plato – Palestra: O Papel do Pensamento e do Sentimento na Meditação. Palestra proferida no II Fórum de Meditação na Sociedade Antroposofica em 31/08/2013

Setzer, Sonia – PARSIFAL um precursor do homem moderno.2ed - São Paulo: Editora Antroposófica, 2012.

Dethlefsen, Thorwald e Dahlke, Rüdiger – A Doença como Caminho. S Paulo: Editora Cultrix, 2001.

JUNG, E. FRANZ, M. L. A lenda do Graal: do ponto de vista psicológico. Tradução de Margit Martincic. São Paulo: Cultrix, 1991.

Prokofieff, Sergei O. – O Encontro com o Mal e sua superação na Ciencia Espiritual – a Pedra Fundamental do Bem. São Paulo: Ed Antroposofica, 2003.

Steiner, Rudolf -  Os Seis Exercícios Complementares e o coração etérico. São Paulo: João de Barro Editora, 2008.

Steiner, Rudolf  Michael, Arthur e o Graal – Palestra em Torquay, 21 de Agosto de 1924 (vol. VIII da coleção Karmic Relationships)

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